BOS BRASILEIROS SÃO não estranhos à inflação. Em meados da década de 1980, as pessoas se aglomeravam em torno dos portões dos supermercados e, assim que eles abriam, corriam para comprar o máximo que podiam carregar. Com uma inflação média de 300% naquela década, valeu a pena chegar cedo. Se um cliente azarado perdesse o rush da manhã, acabaria pagando preços mais altos à tarde.
Os brasileiros de hoje ainda não estão correndo pelos corredores dos supermercados, nem mesmo estocando tanto quanto seus vizinhos inflacionados na Argentina. Mas os brasileiros pobres e, cada vez mais, de classe média estão sentindo o aperto. Com 10,6%, a taxa de inflação está entre as mais altas das grandes economias, e a renda média, ajustada pela inflação, é a mais baixa em oito anos. Os preços da gasolina e do etanol, comumente usados nos carros brasileiros, subiram 47% e 62%, respectivamente, em 2021. A inflação já é um dos temas mais importantes para as eleições presidenciais marcadas para outubro. Totalmente 73% das pessoas pesquisadas em uma pesquisa em janeiro disseram que Jair Bolsonaro, o presidente, fez um mau trabalho ao controlá-lo.
Para amortecer o golpe, Bolsonaro prometeu aumentos salariais e está tentando reduzir os impostos sobre combustíveis. Ele reforçou um pagamento de assistência social introduzido por Luiz Inácio Lula da Silva, presidente de 2003 a 2010 e provavelmente o principal oponente de Bolsonaro na eleição. Para fazer isso, ele convenceu o Congresso a aprovar uma emenda constitucional que derrubou um teto para os gastos públicos, obrigatório por lei desde 2016. Isso enervou os investidores ao sugerir prodigalidade fiscal. Afinal, os gastos imprudentes do governo muitas vezes contribuíram para surtos de inflação alta no passado.
O governo não é o único culpado pelo aumento dos preços, no entanto. A inflação está aumentando em todo o mundo, impulsionada em grande parte pela escassez de oferta e pela espiral dos preços do petróleo. No Brasil, ela foi exacerbada pela pior seca em 90 anos. Um boom de consumo alimentado por estímulos fiscais generosos pode ter empurrado os preços para cima, mas isso também é verdade nos Estados Unidos, onde a inflação de preços ao consumidor está em 7,5%. Além disso, se não fossem os pagamentos emergenciais de Bolsonaro durante a pandemia, o dobro de brasileiros estaria em extrema pobreza – definida como viver com menos de US$ 1,90 por dia – em 2020.
O banco central tem aumentado as taxas muito mais rapidamente do que a maioria de seus homólogos em outros lugares. Sua principal taxa de juros subiu oito pontos percentuais, de 2,75% em março de 2021 para 10,75% em fevereiro deste ano. Esse é o nível mais alto em quase cinco anos. A dura medicina não mostra sinais de acabar. Os preços ao consumidor estão desacelerando a um ritmo mais lento do que o esperado (veja o gráfico), e o banco indicou que novos aumentos podem ser necessários.
Mas problemas mais profundos parecem estar minando os esforços do banco. “Não acho que seja um dado adquirido que a inflação voltará ao controle”, diz Armínio Fraga, um de seus ex-chefes. Um dos motivos são as expectativas. No último orçamento, Bolsonaro conseguiu mais US$ 310 milhões para aumentar os salários dos funcionários do governo cujos salários foram congelados durante a pandemia. Embora seja uma pequena quantidade, abre um precedente. Em 21 de fevereiro, a polícia do estado de Minas Gerais anunciou que entraria em greve para exigir salários mais altos.
As pensões, o salário mínimo e outros tipos de gastos sociais são indexados à inflação. Esses ajustes automáticos manterão a inflação em torno de 6% em 2022, projeta o Credit Suisse, um banco – acima da meta do banco central de 3,5%.
Problemas estruturais semelhantes acreditam nos números dos gastos do governo. Na superfície, eles são muito bons, observa Marco Bonomo, do Insper, uma escola de negócios de São Paulo. No ano passado, as dívidas do governo caíram de 89% do PIB para cerca de 80%. Este foi principalmente o resultado do crescimento e da inflação, embora o déficit orçamentário também tenha sido menor do que o esperado.
Mas, ao enfraquecer o teto de gastos, Bolsonaro não apenas questionou suas próprias credenciais como falcão fiscal, mas também mostrou como seria fácil para um presidente perdulário contornar as regras destinadas a restringir os gastos. Isso degrada todas as promessas futuras de economia.
A preocupação com a futura incontinência fiscal pode explicar a desvalorização do real. Desde que Bolsonaro assumiu o cargo em 2019, caiu mais de 30%, embora tenha se recuperado um pouco recentemente. Isso é incomum: quando os preços das commodities estão altos e o Brasil está com superávit comercial, como está hoje, o câmbio tende a se valorizar. A queda do câmbio, por sua vez, alimenta a inflação, pois os bens importados ficam mais caros.
Em ano eleitoral, no entanto, são os candidatos presidenciais que são a maior fonte de incerteza. Os dois principais concorrentes são camaleões fiscais. Em 2002, a vitória de Lula assustou os mercados, mas ele foi razoavelmente responsável em seus gastos em seu primeiro mandato, pelo menos. Bolsonaro, por outro lado, parece cada vez menos de acordo com Paulo Guedes, seu ministro ortodoxo das Finanças, à medida que seu mandato avança. Por enquanto, os investidores parecem esperar que Lula, que lidera as pesquisas, governe com moderação. Mas, como acontece com o aumento dos preços, eles podem ter uma surpresa desagradável. ⁇
Este artigo apareceu na seção Américas da edição impressa sob o título “O preço dos preços altos”
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